"Trazer luz à obscuridade, transmutar ignorância em conhecimento, é colaborar com o processo de redenção do planeta."

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

JESUS E A FILOSOFIA DA LIBERDADE


Jesus e a filosofia da liberdade

William D. Sversutti


Ouvistes o que foi dito:
Olho por olho e dente por dente.

Eu, porém vos digo
que não resistais ao mal:
mas se alguém te esbofetear
na face direita,
oferece também a outra;

E ao que quiser pleitear contigo
para te tirar a túnica,
deixa-lhe
também o manto;
E se alguém te obrigar
a caminhar uma milha,
vai com ele duas.

Dá a quem te pedir
e a quem quer de ti emprestado,
não lhe volte as costas.
Ouviste o que foi dito:
Amarás o teu próximo e
aborrecerás o teu inimigo.
Eu porém vos digo:

Amai
a vossos inimigos,
bendizei
os que vos maldizem,
fazei bem
aos que vos odeiam e
orai
aos que vos maltratam e perseguem;

Para que sejais filhos do vosso
Pai
que está nos céus:
porque faz que o seu
sol se levante
sobre maus e bons
e a chuva desça
sobre justos e injustos.

Pois se amardes apenas os que vos amam:
- Que recompensa tereis?
E se saudardes somente os vossos irmãos:
- Que fazeis de mais?

Quem tiver ouvidos que ouça.
(Sermão da montanha)


Nesta célebre passagem do sermão da montanha, Jesus nos exorta ao incondicionamento. Ao contrário do que todos recomendam, ou seja, o “olho por olho, dente por dente”, convida-nos a ultrapassar tais limites impostos por um apego excessivo à honra e à importância pessoal centradas no egocentrismo.
Esse egocentrismo exacerbado é o fator condicionante que Jesus ataca, tanto no nível pessoal, quanto no nível familiar (família, etnia, país, religião), quando se refere a amarmos somente aos que nos amam. É, de certa forma, o mesmo egoísmo, porém projetado a alguns poucos convivas. Este fator condicionante é um obstáculo ao verdadeiro amor incondicional.
A atitude incondicionada de amarmos a quem nos humilha é a expressão mais límpida para a liberdade da consciência em relação à todos os condicionamentos impostos aos/pelos homens. Ela é a mesma liberdade do pai que está nos céus e se mostra realizável através da renúncia interior ao egocentrismo. Este é um ensinamento comum a várias religiões, aqui, porém, percebe-se seu cunho prático.
A prática do descondicionamento mediante o desprendimento interior leva a uma revolução na sociedade. De fato, o que mais se percebe na sociedade ocidental atual é a imposição do condicionamento por todos os lados, tanto teóricos quanto práticos.
Do ponto de vista prático, a sociedade de consumo necessita do condicionamento para que a máquina da lucratividade esteja em constante funcionamento. “Faça isto”, “Compre aquilo”, para que seja aceito pelo “grupo”. É o lema de toda propaganda que vemos na TV. E este condicionamento nos é imposto por meios cada vez mais inusitados.
Do ponto de vista teórico muito já se disse sobre a natureza humana ser totalmente determinística, ou seja, condicionada. As filosofias de cunho reducionista (Marxismo, Psiquiatria, Positivismo lógico, etc.) tendem a reduzir todo o fenômeno humano a determinado aspecto (econômico, libido, cientificismo lógico, etc.) da experiência humana. As ciências, notadamente as de cunho epifenomenalista (1), pretendem reduzir todos os fenômenos da consciência humana à materialidade.
Todavia existem alguns teóricos que desbravam, atualmente, o campo do incondicionado e não concordam com a natureza determinista apregoada por tais abordagens. Dentre eles destaco dois, o filósofo Ken Wilber, mediante a psicologia transpessoal, e o físico teórico Amit Goswami, mediante o primado da consciência.
A posição de Wilber é a de admitir os níveis de experiências transpessoais, não como frutos de uma ilusão condicionada, mas como fenômenos passíveis de comprovação. Ao estudar as experiências de cunho místico (Satori, Samadhi) descritas por várias religiões, através da própria vivência e da medição através de EEGs (2), Wilber admite estados de realização pessoal e social que superam os níveis determinísticos e que atingem os níveis incondicionados.
Para o Físico Amit Goswami, o epifenomenalismo das teorias físicas baseadas no primado da matéria sobre a consciência está caindo em descrétido, notavelmente depois das experiências realizadas por Jacobo Grinberg-Zylberbaum, Tony Marcel, Libet e Feinstein e Zaborowski. Consoante a estas experiências, o físico afirma ser a consciência incondicionada pela matéria e passível de correlações não-locais (3) e de outras experiências (como a cura quântica) que envolvem a descontinuidade e a criatividade, sugerindo, assim, o primado da consciência sobre a matéria.
O incondicionamento ensinado por Jesus no sermão da montanha encontra eco nestes dois filósofos contemporâneos na medida em que estes também não admitem ser a natureza humana totalmente demonstrável através de determinismos e reducionismos. Os dois filósofos também admitem que o condicionamento é um fator limitante à possibilidade da liberdade. Romper com estes grilhões leva ao incondicional e à evolução para um estado superior de liberdade: a possibilidade da criatividade e da descontinuidade como a chave dos mistérios da consciência, da libertação do espírito e da revolução na sociedade, que parte da revolução do indivíduo.
Esta, também, é a mensagem de Jesus para a liberdade da consciência. A mensagem da filosofia da liberdade.



Notas
1 – Epifenomenalismo: Idéia de que os fenômenos mentais e a consciência em si são fenômenos secundários da matéria e redutíveis a interações matriciais de alguma estrutura.
2 – Eletro Encefalogramas
3 – Não-Localidade: Uma influência ou comunicação instantânea, sem qualquer troca de sinais através do espaço tempo; uma totalidade intacta ou não-separabilidade que transcende o espaço-tempo.

Referências

WILBER, Ken. Um Deus social.
GOSWAMI, Amit. Deus não está morto.

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