Alguém definiu assim o programa de uma vida digna da fidelidade: É preciso marchar, através das dificuldades, na direção da luz. Os longos e pacientes esforços com que a natureza executa as suas obras e outras tantas lições de vida.
A evolução se faz com uma lentidão e lógica irresistíveis. Por toda parte o espírito de seqüência, por toda a parte a perseverança: nenhuma interrupção, nenhuma pressa. Como se estivesse assentada à beira do oceano. A areia depositada pelas secas do sol, depois o vento a transporta grão a grão e a acumula lentamente em imensas dunas, verdadeiras cadeias de montanhas. Que minucioso trabalho! Entretanto, é inapropriado compará-lo com a formação dos cristais, dos vegetais, dos animais. Nada se faz sem esta rigorosa paciência, aplicadas cada uma à sua função e marchando juntos para o seu fim com uma calma imperturbável.
Imperturbável e com uma rigorosa paciência fica quem cultiva a “Fidelidade”.
Devemos dar unidade à nossa vida. Façamos pouco, mas bem. Como parece simples ter uma idéia e manter a moral, ou fazer penetrar no coração a fidelidade uma companheira indispensável a todas as pessoas. Quem não deseja dizer um dia: Perdi a minha vida.
Não combina que se modifique sem parar os segundos, as impressões do momento, mas que permaneça firme ao que um dia reconheceu como justo. Para que servem as flores, senão para se transformarem em frutos e as boas idéias, senão para se transformarem em atos?
É preciso habituar-se ao equilíbrio e nos mantermos os mesmos e, quando estamos seguros de nosso bom direito, a nos esconder nele. Que as críticas não nos perturbem.
Nada é mais difícil do que guardar fidelidade. A cada passo, em nosso caminho, novas influências vêm exercer seu poder em nós para tentar nos desviar. E se apenas houvesse as dificuldades de fora, seria pouco. Mas há também as de dentro. As disposições se transformam. Prometemos alguma coisa com a maior boa fé possível. Mas quando vem o tempo de cumprir, tudo está modificado: os acontecimentos, as pessoas, nós mesmos; e aquilo que o dever reclama de nós parece tão diferente do que houvermos previsto que balançamos!
Não são muitos os que sabem cumprir um dia chuvoso, aquilo que prometeram num dia de sol. Assim vai o ser humano, atirando o seu coração aos quatro ventos, dando-o e retomando-o de novo, rompendo com o passado, separando-se de si mesmo, por assim dizer. E quando olha para trás, não se reconhece mais. Vê a si próprio marchando lá embaixo nos dias decorridos, como um estranho, para não dizer como muitos estranhos. Isto é tanto mais irônico quanto é certo que o ser humano no seu íntimo, tem sede da fidelidade.
A fidelidade não é só entre o homem e a mulher é muito mais profunda, ela está dentro de cada um e é íntima da consciência. Qualquer ser humano está sujeito a erros. Ao nosso juízo, a fidelidade tem origem nos princípios morais. E ninguém é infiel ao outro antes de ser a si mesmo. A mulher e o homem não devem se igualar a quem é infiel, pois ninguém na verdade é dono de ninguém.
Um viajante anda à procura daquilo que permanece. Das eternas mudanças, das condições da existência, fica no fim uma impressão de melancolia. Ter um lugar onde repouse e a cabeça se fixe, aprofunde-se no último sonho que ele traz das suas peregrinações. E para chegar a isso, é necessário que ele construa a sua casa e cultive o seu jardim; que tenha o seu amor, a sua fé, sua obra, algo com que justifique sua passagem pela Terra, com que possa viver, ser útil e repousar tranqüilo.
Não há nada melhor do que estar seguro, em quem se possa ter confiança, que estar sempre no seu posto, que ser pontual e ser resistente quando alguém se apóia sobre ele. Esse vale o seu peso do ouro. Porque está sempre onde deve estar, ao passo que há uma multidão em toda parte, menos onde são requeridas.
É bastante que os façamos entrar em um cálculo para sermos enganados. Uns são inconstantes por fraqueza de caráter: não podem resistir aos ataques, às insinuações, nem, sobretudo, permanecer fiéis a uma causa derrotada.
Há, sobretudo, uma forma de fidelidade que sofre diariamente agressivos ataques: é a verdade. Mudar de palavra é antes o sinal de uma pessoa amplamente aberta, do que o de uma pessoa baixa e desonesta. Uma música de talento e que se respeita não pode condenar-se a tocar apenas uma balada. Muda de balada e de modo.
Lastimo que a pessoa que consiste em mudar de palavra, em faltar aos compromissos, em trair aos amigos, possa juntar com o nome de habilidade, num tempo em que a habilidade passa por uma das qualidades dominadoras do ser humano. Tudo isso tem uma causa profunda que nunca se conseguiria assinalar exageradamente: esta causa é o descrédito da palavra humana.
Que vale uma palavra para as pessoas que passam os dias a fazer palavras? Uma coisa de que se abusa dessa forma acaba por perder o seu valor. Como quer que um tagarela ponha seu coração em cada palavra que profere? Ele derrama as suas palavras como a árvore espalha as folhas mortas e as esquece assim que tombam. Estamos de tal maneira habituados à vaidade das palavras, que uma coisa dita já não é sagrada.
A palavra não é mais respeitada como uma parte de nós mesmos. Que uma palavra seja um ato e que, uma vez proferida, que lhe torne fiel. Isso está cada vez mais fora de moda. É difícil falar de uma ou de outra sem nos expormos a falar de corda em casa de enforcado. A fidelidade, com efeito, está reduzida ao testemunho sonoro que lhe rendemos em palavras.
A honestidade existe. Nós temos dela mil provas diárias e é fácil reconhecê-la é o bem que se vê a todo instante. O que me faz desconfiar é que a fidelidade tenha entre nós uma figura um tanto fora de moda.
Uma duplicidade profunda, o divórcio entre a palavra e o ato, entre a aparência e a realidade, uma espécie de dupla moral que faz com que sejamos, conforme a hora, sinceros ou não, eis o mal que nos corrói.
Que força moral pode germinar e crescer em tais condições? É preciso voltar a ter princípio, a ter palavra, a fazer boas obras, a ter amor próprio e, para falar numa palavra. Aí está a pura energia do Universo. Fora disso, só há poeira, areia movediça e caniços que vergam a todos os ventos. Ser fiel sobre as mudanças da vida, através das dúvidas, dos desalentos e das próprias faltas.
"Os sábios não se afligem nem pelos vivos nem pelos mortos. Jamais deixei de existir, nem tu, nem estes condutores de homens; nenhum de nós jamais deixará de existir no futuro" (Bhagavad-Guitâ)... Deus que está em toda parte, aqui se faz presente pela demonstração de amor!
"Trazer luz à obscuridade, transmutar ignorância em conhecimento, é colaborar com o processo de redenção do planeta."
quinta-feira, 28 de outubro de 2010
Fidelidade
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